Faça do Coaching um Hábito
Como as perguntas certas (e a escuta ativa) podem melhorar sua liderança
"Faça do Coaching um Hábito"
Este foi um livro que eu comprei em 2021, quando, na pandemia, eu maratonei o podcast da Brené Brown Dare to Lead (Ouse liderar). A Brené entrevistou Michael Bungay Stanier, o autor deste livro, e a conversa foi muito boa. Tão boa que quando terminou o podcast eu comprei o livro imediatamente.
Não se deixe levar pelo termo coach. O sub-título do livro é fantástico, e foi o que me levou a retomar a leitura dele com mais afinco neste ano: "Fale menos, pergunte mais e mude seu estilo de liderança"
Coach
Vamos começar por desmistificar este termo. Vem do inglês, treinador, aquele, o esportivo.
Becky Hammon, ex jogadora e a primeira treinadora mulher, em tempo integral, na história da NBA
Um coach sempre foi um treinador, e um treinamento para virar coach passava por entender que quando queríamos de fato desenvolver pessoas, teríamos de ter pele no jogo.
“Nunca confie em alguém que não arrisca a própria pele” Nassim Nicholas Taleb
Teríamos de angariar conhecimentos, habilidades e competências, além de muita experiência, para não ser uma pessoa que apenas repassa conteúdo vazio. Teríamos de ter vivência, escorregado e nos erguido, mas poder olhar para alguém que escorregou e treinar esta pessoa a não escorregar.
Teríamos de estar na arena. Ser, não apenas parecer ser.
Portanto, quando falo de coach e quando o autor de "Faça do Coaching um Hábito” escreve sobre isso não é sobre empreendedorismo de palco, sobre gurus de instagram que ganham a vida vendendo cursos. Aqui estamos falando de iniciativas aplicáveis, que podem de início parecer simples, mas são ferramentas poderosas que devemos ter em nossa caixa de ferramentas quando estamos falando de liderança, e de uma liderança inclusiva e verdadeira.
Coaching de Desempenho x Desenvolvimento
Conversas de treinamento podem ser classificadas em coaching de desempenho e coaching de desenvolvimento, e saber diferenciar os dois tipos me parece um excelente primeiro passo.
O objetivo de conversar e treinar o desempenho, segundo o autor do livro, é abordar e corrigir apenas o problema ou desafio que as pessoas lideradas podem estar enfrentando. Aqui o foco é o problema.
Já as conversas de desenvolvimento, mais raras, não focam nas questões, e sim priorizam as pessoas que lidam com estas questões. Foco está nas pessoas.
Vai ser mais profunda a conversa, mas mais significativa. Pois em vez de apenas revolver um problema, as conversas de desenvolvimento servem para incentivar a aprender, melhorar e crescer. Para desbloquear potenciais.
As perguntas
São sete as perguntas essenciais que o autor traz em seu livro e que podem ser usadas a qualquer tempo, de maneira informal e formal, em sessões de desenvolvimento, ou quando enxergamos oportunidades de aprendizado e crescimento.
A Pergunta de Arrancada
"No que você está pensando?”
Para sair da pauta engessada, esta pergunta aberta e focada pode trazer um bom início para uma conversa de desenvolvimento.
“É um incentivo para que falem sobre o que os entusiasma, o que os deixa ansiosos, o que os desgasta, o que os leva a acordar de madrugada, o que faz seu coração acelerar.” Michael Bungay Stanier
A Pergunta OQM
“O que mais?"
A melhor pergunta de coaching do mundo tem apenas 3 palavras. Pode parecer, que ao termos mais possibilidades, cairemos na cilada do paradoxo da escolha, quando temos muitas possibilidades e sentimos uma paralisia ao escolher a melhor solução.
Entretanto, o que o autor nos provoca ao trazer a melhor pergunta de coaching do mundo é que esta pergunta traz consigo três importantes razões de existir:
mais opções podem levar a melhores decisões: tendemos a ter uma primeira ideia conectada com universos que nos é familiar. Provocar um mini brainstorming com a pergunta: 'o que mais?' pode ser muito bom para mitigarmos viéses inconscientes.
você se controla: esta é para líderes palestrinhas (ops, eu?), que gostam de ouvir e já aconselhar. A pergunta 'o que mais?' vai segurar a nossa onda e deixar a pessoa pensar e trazer suas próprias ideias antes de ser bombardeada de conselhos e soluções.
você ganha tempo: quando você não tem certeza da situação, ou ela ainda é muito abstrata, a pergunta 'o que mais?' vai te trazer mais insights, mais caminhos e mais tempo para chegarmos na solução que mais se encaixa.
A Pergunta do Foco
"Qual o verdadeiro desafio para você?"
Gosto desta pergunta e vou mostrar porque cada parte dela importa:
"qual o desafio?"
Se a pergunta for feita assim ela é muito vaga. É provável que a primeira resposta seja muito abstrata e nada profunda."qual o verdadeiro desafio?"
Aqui já encontramos um caminho, adicionar a palavra 'verdadeiro' faz a pessoa liderada se concentrar naquilo que é mais relevante ou mais importante no momento."qual o verdadeiro desafio para você?"
Adicionando a palavra 'você' temos a cereja do bolo. Segundo o autor, dar opiniões sobre desafios e obstáculos é fácil, mas quando a pergunta é direcionada à pessoas temos a provocação do 'accountability', da responsabilidade individual daquela pessoa sobre o desafio. A solução pode passar por muitas camadas externas à pessoa, mas o primeiro passo pode ser explorar o que pode ser redirecionado naquela pessoa, naquele momento.
Temos aqui uma ação individual, pronta para ser coloca em prática. E antes de usar, recomendo, faça a pergunta para você.
A Pergunta de Base
“O que você quer?”
“Assumir a responsabilidade pela própria liberdade não é fácil” Michael Bungay Stanier
Ela é considerada uma pergunta de base porque muitas vezes acessamos as profundas raízes de algo a ser trabalhado, pelo simples fato que muitas vezes temos um problema ou um desafio, mas não sabemos o que queremos em relação a ele.
E se tá difícil para sabermos isso à nível individual, imagina em nossas interações diárias?! O resultado neste nosso desconhecimento é a pura frustração. Quando entendemos melhor nossas necessidades e desejos (e é preciso também diferenciar as duas coisas) estabelecemos trocas mais genuínas, seguras e interessantes.
A Pergunta Preguiçosa
"Como posso ajudar?”
Neste capítulo o termo 'preguiçoso’ é usado como forma de mostrar à liderança que não é preciso ser centralizados ou se tornar microgerenciador para que as coisas sejam feitas.
Para desenvolver melhor nossas pessoas lideradas, podemos (e devemos!) trazer a responsabilidade para que elas também tomem decisões acertadas de como o apoio da gestão pode ser mais eficiente.
A Pergunta Estratégica
“Ao dizer Sim à isto, a que você estará dizendo Não?”
Esta pergunta é considerada estratégica, pois o próprio termo estratégia anda muito banalizado e vazio hoje em dia. E mais fácil do que explicar o que é estratégico, ou prioritário, é analisar o que estamos deixando de lado, quando escolhemos um caminho de ação.
Recursos são finitos, então quais pratos caem se formos por este caminho? Tempo é escasso, então o que será alongado se priorizarmos uma única frente?
E para corroborar com este pensamento, em vez de trazer mais explicações, trouxe mais mentes brilhantes que nos ajudam a entender este raciocínio:
"A essência da estratégia é a escolha do que não fazer"
Michael Porter (retirado do livro Faça do Coaching um Hábito)
"As pessoas acham que foco significa dizer 'sim' para a coisa que você precisa focar. Mas isso nada tem a ver como foco. Foco significa dizer 'não' para a centena de outras boas ideias que existem. Você precisa escolher com cuidado. Na verdade, sinto-me tão orgulhoso das coisas que não fizemos quanto das coisas que já fiz . Inovação é dizer 'não' para mil coisas."
Steve Jobs (retirado do livro Antifrágil, do Nassim Nicholas Taleb)
"A mais extraordinária - e mais robusta - contribuição para o conhecimento consiste em eliminar o que julgamos estar errado (...) temos muito mais consciência sobre o que está errado do que sabemos sobre o que está certo, ou, para reformular de acordo com a classificação frágil/robusto, o conhecimento negativo (o que é errado, o que não funciona) é mais robusto ao erro do que o conhecimento positivo (o que é certo, o que funciona)."
Nassim Nicholas Taleb (retirado do livro Antifrágil, na explicação sobre Via Negativa)
"Quanto mais pensamos no que estamos abrindo mão quando dizemos 'sim' para alguém, mais fácil é dizer não. Se não tivermos um senso claro do nosso custo de oportunidade - em outras palavras, o valor que estamos deixando na mesa - então é mais fácil cairmos na armadilha não essencial de dizer à nós mesmos que damos conta de tudo. Nós não damos. Um 'não' gracioso surge de um claro e, por vezes não dito, cálculo de custo-benefício.
Greg McKeown (retirado do livro Essencialismo, do capítulo Ouse, o poder de um gracioso não)
A Pergunta do Aprendizado
“O que foi mais útil para você?"
De volta uma pergunta capaz de encerrar de maneira grandiosa uma conversa de desenvolvimento, que funciona bem por todas as suas partes:
estabelece, como princípio, que a conversa foi útil:;
pede que seja identificado o aspecto mais importante;
torna a questão pessoal, adicionando o 'para você’;
gera feedback para você, o líder que está conduzindo a conversa;
é aprendizado e não um julgamento de como a conversa foi;
Conclusão
"Como gerente e líder, você quer que as pessoas façam o trabalho. Mas não é so isso; você quer mais. Quer que aprendam para que se tornem mais competentes, autossuficientes e bem-sucedidas. O bom é que elas também querem isso (…) As pessoas não aprendem de verdade quando você lhes diz algo. Elas não aprendem nem quando fazem determinada coisa. Só começam a aprender, a criar novos caminhos neurais, quando têm a chance de lembrar e refletir sobre o que aconteceu.” Michael Bungay Stanier.
Ao longo do livro, o autor nos lembra o quanto temos de estar confortáveis com o silêncio e o quanto temos que ter escuta ativa. E uma de suas dicas práticas, que em sua opinião é uma das atitudes mais inspiradoras que você pode ter depois de fazer uma pergunta, é:
OUVIR A RESPOSTA COM ATENÇÃO GENUÍNA.
Difícil de implementar, ahh eu sei. Mas concordo que perco toda a energia investida quando troco ideias relevantes com alguém que desvia o olhar porque está vendo mensagens, ou dá aquela olhadela rápida no celular. Onde está o foco em uma conversa de desenvolvimento, não é?
Sua dica final: permaneça com curiosidade.